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Decisão da Justiça de Nova Odessa desconsidera aprovação do empreendimento

Justiça anula decretos que autorizam Jardim Flamboyant, em Nova Odessa

Além dos decretos municipais que aprovaram condomínio, todos atos administrativos, como o registro e obras foram declarados nulos na sentença; decisão cita uso de base legal inconstitucional e manobras para legitimar loteamento  

A Justiça de Nova Odessa anulou decretos municipais que aprovaram o Residencial Jardim Flamboyant. A decisão é do juiz Luiz Gustavo Primon, que declarou nulos os decretos 4.342/2020, 4.418/2021, 4.500/2021, 4.501/2021 e 4.550/2022, além de todos os atos administrativos decorrentes deles, incluindo aprovação, registro e execução das obras do empreendimento.

A sentença teve origem em ações populares ajuizadas por Silvio Natal e Daniela da Vinha Júlio. Eles alegavam que a aprovação do loteamento Jardim Flamboyant, também chamado Residencial Flamboyant, foi realizada com base em normas municipais declaradas inconstitucionais e sem a devida participação popular.

O loteamento em questão foi originalmente aprovado pelo Decreto Municipal 4.342, de 2020, no “apagar das luzes” do mandato do ex-prefeito Benjamim Bill Vieira de Souza (PL). Em 2021, o novo prefeito de Nova Odessa, Claudio Schooder, o Leitinho (PSD), revogou o decreto para renegociar contrapartidas urbanísticas com a construtora. Assim, foi publicado o Decreto nº 4.358/2021, que revogou o anterior, e, posteriormente, em maio de 2021, o empreendimento foi reautorizado por outro decreto.

 Contudo, em fevereiro de 2021, o Tribunal de Justiça havia declarado a inconstitucionalidade da Lei Complementar nº 36/2014, que criou as chamadas Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS) — justamente a base legal usada para viabilizar o loteamento. Essa lei foi considerada inconstitucional por não ter sido precedida de estudos técnicos e por ausência de participação popular. O TJ modulou os efeitos da decisão para evitar insegurança jurídica, preservando, em tese, atos praticados até aquela data.

Mesmo com os questionamentos judiciais em curso, a empresa Água Branca Construtora e Incorporadora registrou o loteamento em 14 de maio de 2021 e lançou comercialmente 217 unidades habitacionais, que foram todas vendidas. As obras tiveram início logo em seguida.

Em sua defesa, a empresa alegou que o processo de aprovação começou em 2016 e que, em 2019, obteve aprovação prévia junto ao GRAPROHAB, órgão estadual responsável pela análise de projetos habitacionais. Segundo a construtora, o decreto de aprovação final foi emitido em dezembro de 2020, antes do trânsito em julgado da decisão de inconstitucionalidade.

O juiz de Nova Odessa considerou na decisão que a base legal utilizada para aprovar o loteamento foi invalidada e, portanto, os decretos não poderiam subsistir. Ele avaliou como nulas as autorizações e os atos administrativos decorrentes, incluindo registro, vendas e execuções de obras.

“Restou claro que os decretos foram editados em afronta à decisão do Tribunal de Justiça, que já havia reconhecido a inconstitucionalidade da lei que fundamentava o zoneamento. Além disso, ficou evidenciado o uso indevido do instituto da repristinação, que não se aplica a atos normativos infralegais”, escreveu o magistrado.

A decisão ainda suspendeu os efeitos do mais recente decreto (4.550/2022), que também visava manter o empreendimento ativo.

INDENIZAÇÕES

O município, em sua defesa, argumentou que a manutenção do empreendimento seria necessária para evitar indenizações milionárias e proteger compradores de boa-fé. No entanto, a Justiça destacou que a proteção do interesse público e do ordenamento jurídico urbano deve prevalecer.

Na ação, Leitinho argumentou que o empreendimento foi inicialmente aprovado em 2020, mas com contrapartidas consideradas insuficientes para mitigar os impactos de um projeto de alta densidade. Após revisão, foi assinado um novo decreto em 2021, buscando garantir melhores benefícios ao município. A defesa de Renan Cogo, ex-adjunto de Obras, argumentou que o processo administrativo de aprovação do loteamento começou em 2016, tendo sido aprovado integralmente ao final de 2020.

A construtora Água Branca também se manifestou, defendendo a validade do mais recente decreto (4.550/2022), que aprovou novamente o loteamento, desta vez fundamentado na Lei Complementar nº 70/2022. Essa lei, segundo a empresa, reinseriu a figura da ZEIS no ordenamento jurídico municipal de forma legítima, garantindo a base legal para o empreendimento. A construtora destacou que todos os requisitos legais foram atendidos, não havendo violação ao Plano Diretor ou a outras normas urbanísticas.

O município, por sua vez, disse que o loteamento foi aprovado com base em diversas normas federais e municipais, incluindo o Estatuto da Cidade e a Lei de Parcelamento do Solo Urbano.

Contudo, de acordo com a análise judicial, a sucessão de decretos indica manobras jurídicas para legitimar o empreendimento “à revelia de decisão judicial” que já havia afastado a ZEIS do ordenamento jurídico local. A tentativa de “reviver” decretos anteriores, apoiados em lei já declarada inconstitucional, foi interpretada como desvio de finalidade e violação aos princípios da administração pública.

PROMOTORIA

A Promotoria também opinou no sentido de que os atos administrativos que autorizaram o Flamboyant deveriam ser anulados. A decisão cabe recurso.

 

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