Política
Justiça de Monte Mor analisa denúncia e pedidos de ressarcimento feitos pelo Ministério Público

MP quer devolução de R$ 589 mil por gastos ilegais com combustíveis na Câmara de Monte Mor e ajuiza ação

Promotoria de Justiça moveu ação de improbidade administrativa contra 39 agentes públicos e ex-vereadores da cidade, pedindo a restituição dos valores de gastos apontados como irregulares; investigação revelou uso de carros oficiais para fins pessoais, planilhas adulteradas e fraudes em registros de quilometragem, com anotações de elevadas distâncias

O Ministério Público ingressou com ação civil pública de improbidade administrativa contra 39 agentes públicos e ex-vereadores de Monte Mor, pedindo a devolução de R$ 589.094,78 aos cofres públicos. A ação decorre de uma investigação que revelou um esquema de fraudes no uso de veículos oficiais e no consumo de combustíveis entre março de 2017 e maio de 2018.

Segundo as alegações finais do MP, datadas de junho deste ano, após apuração em inquérito civil instaurado em 2018, vereadores, assessores e servidores utilizaram veículos locados pela Câmara para fins particulares, fraudando planilhas de deslocamento e simulando viagens oficiais. Para justificar gastos elevados com combustíveis, apresentavam registros de quilometragem adulterados e deslocamentos fictícios, muitos deles incompatíveis com as distâncias reais.

Uma das principais evidências apontadas pelo MP foi a repetição sistemática de distâncias percorridas. Em 1.420 registros analisados, a distância exata de 200 quilômetros diários apareceu em 478 casos, enquanto trajetos de 300 quilômetros surgiram 63 vezes em 222 registros. Para o MP, isso indica um “acordo” informal para justificar gastos com combustível e inflar os relatórios de uso.

Além disso, foram encontradas situações como um registro em que um ex-vereador teria percorrido 570 quilômetros em um único dia apenas para visitar bairros de Monte Mor. Em outro caso, um funcionário apontou que viajou 410 quilômetros até Campinas supostamente para realizar compras e orçamentos. Há ainda um ex-agente que declarou ter rodado 511 quilômetros para ir à Secretaria de Educação de Indaiatuba, cidade distante apenas 25 quilômetros de Monte Mor.

Outro exemplo citado foi o deslocamento do então presidente da Câmara, Walton Assis Pereira, que alegou viagens de até 760 quilômetros em trajetos que, na prática, não ultrapassariam 220 quilômetros.

FALSIFICAÇÃO DE DESTINOS

O MP também destacou divergências entre os destinos informados nas planilhas e as distâncias reais. O então diretor da Câmara, William Freire dos Santos, declarou viagens para São José do Rio Preto com deslocamento de 400 quilômetros, mas a distância real (ida e volta) seria de 704 quilômetros. Em outro caso, uma assessora relatou viagens a Avaré registrando 200 e 212 quilômetros, quando na verdade o percurso somaria 418 quilômetros.

A investigação também revelou que, em diversas ocasiões, grandes trechos de quilometragem ficaram sem registro oficial, indicando que veículos foram usados para finalidades privadas sem qualquer controle.

RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA

Além dos autores diretos dos desvios, o MP responsabiliza ex-vereadores que permitiram ou não fiscalizaram o uso irregular dos veículos por seus assessores. Entre eles, figuram nomes como Danilo Jacob, Vanderlei Soares e Selma Fernandes de Souza Alves, que mesmo sem utilizarem os veículos, são acusados de negligência por não exercerem o dever de fiscalização sobre seus gabinetes.

DEDCOLUÇÃO DE DINHEIRO

O Ministério Público requer a devolução integral dos valores pagos indevidamente com combustível e locação de veículos, totalizando R$ 589.094,78. Os ex-gestores Walton Assis Pereira e William Freire dos Santos, por ocuparem cargos de direção, são apontados como os principais responsáveis e podem responder solidariamente por eventual restituição integral do prejuízo.

A Promotoria ainda pede que os outros envolvidos devolvam valores proporcionais à utilização irregular identificada. O MP também aponta enriquecimento ilícito e prejuízo ao erário, com base na Lei de Improbidade Administrativa. Os acusados podem ainda receber penalidades como suspensão dos direitos políticos, perda de cargo público e proibição de contratar com o poder público. O processo tramita na 1ª Vara Judicial de Monte Mor. Os acusados contestaram as acusações.

GASTO COM CARROS DO LEGISLATIVO DE MONTE MOR DARIA PARA DAR NOVE VOLTAS NA TERRA, CALCULA MP

A Promotoria de Justiça de Monte Mor apontou que o uso de veículos oficiais pela Câmara Municipal no período da denúncia de gastos ilegais somou quilometragem equivalente a quase nove voltas ao redor do planeta Terra. Segundo o Ministério Público, em apenas 15 meses, os carros locados percorreram 349.794 quilômetros — distância suficiente para dar 8,7 voltas no perímetro terrestre, que mede cerca de 40.075 km.

De acordo com o MP, o então presidente da Câmara, Walton Assis Pereira, e o diretor-geral, William Freire dos Santos, foram os principais responsáveis por autorizar os gastos sem qualquer controle ou fiscalização. Ambos permitiram o uso indiscriminado dos veículos por vereadores, assessores e até por eles mesmos, sem justificativa de interesse público ou comprovação da necessidade dos deslocamentos, segundo o MP.

Mesmo sendo cinco vezes menor, Câmara gastou cerca de 65% do valor que Sumaré destinou a combustíveis em 2017 e 2018

Os documentos revelam que não havia critério para liberação dos carros: bastava que qualquer parlamentar ou assessor solicitasse o veículo, e o pedido era automaticamente autorizado, sempre pago com dinheiro público. Em muitos casos, as distâncias registradas sequer correspondiam aos destinos informados, ou não eram suficientes para justificar ida e volta. Quando havia alguma justificativa, ela era genérica e impossibilitava qualquer fiscalização efetiva, de acordo com a Promotoria.

Em comparação com outras cidades, o gasto de Monte Mor chama atenção. Mesmo sendo cinco vezes menor que Sumaré, a Câmara local gastou cerca de 65% do valor que Sumaré destinou a combustíveis em 2017 e 2018. Além disso, Monte Mor gastou 27 vezes mais que Elias Fausto e 14 vezes mais que Rio das Pedras.

O MP destacou que, enquanto Sumaré gastou R$ 286 mil em combustíveis para 22 veículos, Monte Mor despendeu R$ 183 mil para abastecer apenas 9 carros, além de gastar R$ 405 mil com locação. Somados, os gastos ultrapassaram meio milhão de reais.

DEZ CARROS POPULARES

O órgão ainda apontou que os valores utilizados para alugar os veículos dariam para comprar ao menos dez carros populares, que poderiam ser usados por vários anos e revendidos depois, gerando retorno ao erário. Além de Walton e William, duas servidoras responsáveis pelo controle de uso dos veículos também foram citadas por omissão. Segundo o MP, ambas não fiscalizaram adequadamente e não comunicaram as irregularidades aos superiores.

O caso ainda revelou suspeitas de clientelismo e uso dos veículos para viagens de lazer ao litoral, especialmente em datas próximas a feriados. Para o Ministério Público, as planilhas de controle foram manipuladas para dar aparência de legalidade a condutas “flagrantemente ilegais”. A denúncia foi formalizada em ação civil pública.




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