Justiça condena ex-agentes públicos de Monte Mor por falsificação de documentos em esquema de combustíveis
1ª Vara culpou ex-presidente da Câmara e ex-servidores por
387 atos de falsidade ideológica; crimes envolviam adulterações em checklists
de veículos oficiais e requisições de combustível para viagens
Ex-integrantes da Câmara Municipal de Monte Mor foram
condenados pela Justiça por falsidade ideológica. A sentença, do juiz Gustavo
Nardi, da 1ª Vara Cível da cidade, responsabiliza criminalmente os réus por
centenas de inserções fraudulentas em documentos oficiais entre os anos de 2017
e 2018, com o objetivo de mascarar o uso dos veículos da Câmara e justificar
irregularmente gastos com combustível.
O então diretor da Câmara, Willian Freire dos Santos, foi
condenado por 105 crimes de falsidade ideológica, enquanto o ex-presidente da
Casa, Walton Assis Pereira, foi condenado por 118 falsificações. Também foram
condenados três servidores por mais de 160 falsificações.
Segundo a denúncia do Ministério Público, os réus inflavam
dados nos checklists de veículos e nas requisições de combustível, simulando
viagens mais longas do que as realmente realizadas. Documentos falsos eram
entregues ao setor responsável e usados para prestar contas junto ao Tribunal
de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP), segundo a Justiça.
Apesar das justificativas apresentadas pelos réus — como
erro de digitação, divergência por uso de rotas alternativas e falta de preparo
técnico —, o magistrado apontou que houve “clara intenção de ludibriar os órgãos
de controle”.
Nos depoimentos, os acusados admitiram uso frequente dos
carros da Câmara e reconheceram discrepâncias entre os dados informados e os
registros de quilometragem. Em alguns casos, foram relatadas viagens que
somariam até 2.500 km em um único dia, número incompatível com as distâncias
entre os destinos declarados.
“Como narra a denúncia, no período compreendido entre março de 2017 a maio de 2018, nesta cidade e Comarca de Monte Mor, Willian Freire dos Santos, devidamente qualificado, funcionário público, prevalecendo-se do cargo que exercia, inseriu, por 105 vezes, declaração falsa em documento público”, traz o juiz na sentença. As defesas de Willian Freire dos Santos e Walton Assis Pereira pediram a absolvição dos réus. “O pedido penal condenatório deve ser julgado procedente. A materialidade delitiva restou comprovada”, apontou o magistrado.
Ao ser questionado pela polícia, o ex-presidente da Casa
disse que a utilização dos veículos se dava por meio de escala, onde o
declarante tinha a sua disposição um veículo Toyota/Corolla. “Quanto aos
demais, disse que um veículo ficava à disposição de dois vereadores que se
ajustavam entre si no revezamento, sendo que já havia uma escala prévia
estipulando o uso de um dia sim e outro não para cada vereador. Narrou que quem
conduzia os veículos era o próprio vereador ou seu assessor, sendo que ambos
eram responsáveis pelo preenchimento do checklists dos veículos, tanto na
retirada, quanto na entrega do veículo. Em relação às requisições para efetuar
o abastecimento dos veículos, os vereadores ou assessores as retiravam com o
diretor, que era o responsável por assinar as requisições (...) Narrou que, na
maioria das vezes, enchiam o tanque e utilizavam os combustíveis para outros
fins, do dia a dia, mas para ‘fins do Município’, e que fazia isso de relatar
somente uma viagem para simplificar a gestão da coisa”, cita o juiz na decisão.
Ao ser questionado sobre a ida e volta para Americana ter
dado 490 km, disse que “o que pode ter acontecido é terem ido para Americana,
Sumaré, Santa Bárbara, aproveitado a viagem, e depois o carro pode ter sido
utilizado no dia a dia nos trabalhos da Câmara até dar os 490 km”, menciona.
“Observa-se que o denunciado Walton registrou deslocamentos
de 526, 490 e 760 quilômetros, com destinos nas cidades de Itu (526 km),
Sorocaba (526 km), Americana (490 km) e Campinas/Bragança Paulista (760 km). O
percurso de ida e volta para Sorocaba totaliza 155 quilômetros, enquanto a
cidade de Itu encontra-se no trajeto entre Monte Mor e Sorocaba. O trajeto de
ida e volta para Americana soma 70 quilômetros, Bragança Paulista, a distância
é de 220 quilômetros, com Campinas localizando-se no caminho entre Monte Mor e
Bragança. As quilometragens declaradas são mais que três vezes mais do que a distância
real entre os municípios”, afirma o magistrado.
“Julgo procedente a pretensão punitiva veiculada na denúncia
para condenar os réus Walton Assis Pereira, como incurso, por 118 vezes, no
artigo 299, parágrafo único, do Código Penal, ao cumprimento de pena de dois
anos, três meses e seis dias de reclusão, em regime aberto, além do pagamento
de 21 dias-multa, no mínimo legal, substituída a pena privativa de liberdade
por duas penas restritivas de direito, consistentes em prestação de serviços à
comunidade na razão de uma hora de trabalho para cada dia de condenação e
prestação pecuniária de cinco salários mínimos vigentes à época dos fatos”,
traz trecho da sentença. O ex-diretor da Casa foi condenado a quatro anos e
seis meses de reclusão e outros três ex-servidores condenados a dois anos e
três meses. Os réus ainda poderão recorrer da decisão. A reportagem não
conseguiu contato com as defesas nesta sexta-feira (25).
Em ação civil pública, Promotoria de Justiça pede devolução
de R$ 589 mil aos cofres do município
O Ministério Público ainda ingressou com ação civil pública
de improbidade administrativa contra 39 agentes públicos e ex-vereadores de
Monte Mor, pedindo a devolução de R$ 589.094,78 aos cofres públicos. A ação
decorre de uma investigação que revelou um esquema de fraudes no uso de
veículos oficiais e no consumo de combustíveis entre março de 2017 e maio de
2018.
Segundo as alegações finais do MP, datadas de junho deste
ano, após apuração em inquérito civil instaurado em 2018, vereadores, assessores
e servidores utilizaram veículos locados pela Câmara para fins particulares,
fraudando planilhas de deslocamento e simulando viagens oficiais. Para
justificar gastos elevados com combustíveis, apresentavam registros de
quilometragem adulterados e deslocamentos fictícios, muitos deles incompatíveis
com as distâncias reais.
Promotoria solicita na Justiça que acusados de atuação em esquema devolvam valores
A investigação também revelou que, em diversas ocasiões, grandes trechos de quilometragem ficaram sem registro oficial, indicando que veículos foram usados para finalidades privadas sem qualquer controle. Além dos autores diretos dos desvios, o MP responsabiliza ex-vereadores que permitiram ou não fiscalizaram o uso irregular dos veículos por seus assessores.
O Ministério Público requer a devolução integral dos valores pagos indevidamente com combustível e locação de veículos, totalizando R$ 589.094,78. Os ex-gestores Walton Assis Pereira e William Freire dos Santos, por ocuparem cargos de direção, são apontados como os principais responsáveis e podem responder solidariamente por eventual restituição integral do prejuízo. A Promotoria ainda pede que os outros envolvidos devolvam valores proporcionais à utilização irregular identificada.
VOLTAS NA TERRA
A Promotoria de Justiça de Monte Mor apontou que o uso de
veículos oficiais pela Câmara Municipal no período da denúncia de gastos
ilegais somou quilometragem equivalente a quase nove voltas ao redor do planeta
Terra. Segundo o Ministério Público, em apenas 15 meses, os carros locados
percorreram 349.794 quilômetros — distância suficiente para dar 8,7 voltas no
perímetro terrestre, que mede cerca de 40.075 km.
Deixe um comentário