Nutrição Além do Prato
Obesidade não é escolha: entenda sua complexidade
A obesidade não é uma questão de escolha. Ela não se resume
a comer demais ou se exercitar pouco. Reduzir o peso corporal a uma questão de
disciplina ou força de vontade ignora a complexidade dessa condição e reforça
preconceitos que prejudicam a saúde física e emocional de milhões de pessoas. Na
realidade, a obesidade é uma doença crônica, complexa e multifatorial, que
envolve fatores biológicos, genéticos, hormonais, emocionais, ambientais e
sociais.
Quando falamos em doenças crônicas, estamos nos referindo a
condições de longa duração que se desenvolvem gradualmente e exigem
acompanhamento contínuo. Assim como diabetes, hipertensão e asma, a obesidade
não é algo que se resolve apenas com força de vontade. Ela demanda atenção
profissional, estratégias de cuidado individualizadas e políticas públicas que
promovam ambientes mais saudáveis.
A genética também desempenha um papel importante. Algumas
pessoas naturalmente acumulam mais energia, enquanto outras gastam calorias com
mais facilidade. Isso não define o futuro, mas ajuda a explicar por que nem
todos respondem da mesma forma aos mesmos hábitos.
Outro ponto importante é a sinalização hormonal, que
influencia diretamente o peso corporal. Entre todos os hormônios envolvidos,
dois se destacam: a grelina e a leptina. A grelina, conhecida como “hormônio da
fome”, funciona como um alarme, avisando que o corpo precisa de energia e
estimulando a busca por alimento. A leptina age como um semáforo: indica quando
já temos combustível suficiente, sinalizando a saciedade. Em algumas pessoas,
esse semáforo não funciona como deveria ou demora a aparecer, o que pode levar
a um consumo de calorias maior do que o necessário. Ou seja, nosso corpo nem
sempre responde de forma previsível, mesmo quando tentamos seguir hábitos
saudáveis.
A obesidade também é influenciada por fatores ambientais e
socioeconômicos. O acesso limitado a alimentos frescos, a presença abundante de
produtos ultraprocessados, a falta de espaços seguros para atividades físicas e
condições econômicas desfavoráveis aumentam consideravelmente o risco de
obesidade. Assim, não se trata apenas de escolhas individuais, mas de escolhas
moldadas por um ambiente que nem sempre é favorável à saúde.
As emoções também exercem papel central. Estresse, cansaço e
ansiedade podem intensificar a fome, diminuir a energia e dificultar a prática
de atividades físicas. Esse é mais um exemplo de como múltiplos fatores se
combinam, tornando o cuidado com o peso um desafio complexo e multifacetado.
A obesidade, portanto, deve ser encarada como um problema de
saúde pública. Enfrentá-la requer ações integradas que vão além do cuidado
individual: políticas de incentivo a ambientes saudáveis, programas de educação
nutricional, regulamentações sobre alimentos ultraprocessados e campanhas de
conscientização são essenciais. Mas também é crucial mudar a forma como a
sociedade enxerga essa condição. O preconceito e o julgamento social não ajudam
ninguém; pelo contrário, dificultam o acesso a tratamentos, pioram a saúde
mental e reforçam a exclusão social.
Reconhecer a obesidade como uma doença crônica e
multifatorial é fundamental para promover compreensão, empatia e ciência. O
combate ao estigma começa quando entendemos que o peso corporal de uma pessoa
não é sinônimo de esforço, caráter ou escolha moral. Tratar a obesidade com
cuidado, respeito e informação é um passo essencial para construir uma
sociedade mais saudável, justa e inclusiva. Entender a obesidade é um passo
para respeitar vidas, não para julgá-las.
Marina Rocha Luciano é nutricionista clínica esportiva,
formada pela UNICAMP (Universidade de Campinas) e com pós-graduação pela USP
(Universidade de São Paulo). Atua com foco na promoção da saúde e qualidade de
vida, melhora da composição corporal e da performance esportiva. Por meio de
uma nutrição com propósito, respaldada na ciência, busca promover autonomia
alimentar com estratégias individualizadas, eficazes e sustentáveis. Atende na
clínica Centerclin, em Sumaré.
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