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Marina Rocha Luciano é nutricionista clínica esportiva com foco na promoção da saúde e qualidade de vida

Nutrição Além do Prato

Obesidade não é escolha: entenda sua complexidade

A obesidade não é uma questão de escolha. Ela não se resume a comer demais ou se exercitar pouco. Reduzir o peso corporal a uma questão de disciplina ou força de vontade ignora a complexidade dessa condição e reforça preconceitos que prejudicam a saúde física e emocional de milhões de pessoas. Na realidade, a obesidade é uma doença crônica, complexa e multifatorial, que envolve fatores biológicos, genéticos, hormonais, emocionais, ambientais e sociais.

Quando falamos em doenças crônicas, estamos nos referindo a condições de longa duração que se desenvolvem gradualmente e exigem acompanhamento contínuo. Assim como diabetes, hipertensão e asma, a obesidade não é algo que se resolve apenas com força de vontade. Ela demanda atenção profissional, estratégias de cuidado individualizadas e políticas públicas que promovam ambientes mais saudáveis.

A genética também desempenha um papel importante. Algumas pessoas naturalmente acumulam mais energia, enquanto outras gastam calorias com mais facilidade. Isso não define o futuro, mas ajuda a explicar por que nem todos respondem da mesma forma aos mesmos hábitos.

Outro ponto importante é a sinalização hormonal, que influencia diretamente o peso corporal. Entre todos os hormônios envolvidos, dois se destacam: a grelina e a leptina. A grelina, conhecida como “hormônio da fome”, funciona como um alarme, avisando que o corpo precisa de energia e estimulando a busca por alimento. A leptina age como um semáforo: indica quando já temos combustível suficiente, sinalizando a saciedade. Em algumas pessoas, esse semáforo não funciona como deveria ou demora a aparecer, o que pode levar a um consumo de calorias maior do que o necessário. Ou seja, nosso corpo nem sempre responde de forma previsível, mesmo quando tentamos seguir hábitos saudáveis.

A obesidade também é influenciada por fatores ambientais e socioeconômicos. O acesso limitado a alimentos frescos, a presença abundante de produtos ultraprocessados, a falta de espaços seguros para atividades físicas e condições econômicas desfavoráveis aumentam consideravelmente o risco de obesidade. Assim, não se trata apenas de escolhas individuais, mas de escolhas moldadas por um ambiente que nem sempre é favorável à saúde.

As emoções também exercem papel central. Estresse, cansaço e ansiedade podem intensificar a fome, diminuir a energia e dificultar a prática de atividades físicas. Esse é mais um exemplo de como múltiplos fatores se combinam, tornando o cuidado com o peso um desafio complexo e multifacetado.

A obesidade, portanto, deve ser encarada como um problema de saúde pública. Enfrentá-la requer ações integradas que vão além do cuidado individual: políticas de incentivo a ambientes saudáveis, programas de educação nutricional, regulamentações sobre alimentos ultraprocessados e campanhas de conscientização são essenciais. Mas também é crucial mudar a forma como a sociedade enxerga essa condição. O preconceito e o julgamento social não ajudam ninguém; pelo contrário, dificultam o acesso a tratamentos, pioram a saúde mental e reforçam a exclusão social.

Reconhecer a obesidade como uma doença crônica e multifatorial é fundamental para promover compreensão, empatia e ciência. O combate ao estigma começa quando entendemos que o peso corporal de uma pessoa não é sinônimo de esforço, caráter ou escolha moral. Tratar a obesidade com cuidado, respeito e informação é um passo essencial para construir uma sociedade mais saudável, justa e inclusiva. Entender a obesidade é um passo para respeitar vidas, não para julgá-las.

Marina Rocha Luciano é nutricionista clínica esportiva, formada pela UNICAMP (Universidade de Campinas) e com pós-graduação pela USP (Universidade de São Paulo). Atua com foco na promoção da saúde e qualidade de vida, melhora da composição corporal e da performance esportiva. Por meio de uma nutrição com propósito, respaldada na ciência, busca promover autonomia alimentar com estratégias individualizadas, eficazes e sustentáveis. Atende na clínica Centerclin, em Sumaré.

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